Galdino Artes

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Mendigos...



Sete de Setembro. Dizem que é o Dia da Independência. Eles fingem que me dizem e eu finjo que acredito. Mas não estou me referindo à Independência decretada por D. Pedro I, às margens do rio Ipiranga, de acordo com o quadro de Pedro Américo, que é só uma imaginação do artista. Eu falo de outra independência, essa que não existe. É domingo. Perto das 9 horas. Começa a passeata dos moradores de rua, da qual participo. Estou no meio deles, seguindo devagar, andando devagar, um caminhão de som, alguém sempre falando dessas pessoas completamente abandonadas, totalmente deixadas de lado. Muitas faixas dizem: “O grito dos excluídos e das excluídas”. Trezentas, quatrocentas pessoas. Eu caminho junto. Costumo conversar com os moradores de rua, aqueles que vivem misturado no lixo e cobertores na rua embaixo de marquises...Os prédios morreram. As calçadas morreram. As janelas morreram. As pessoas morreram. Debaixo dos viadutos vive boa parte dos moradores de rua, vida que se estende dos toldos comerciais ,praças...Converso com essas pessoas. Choro pelas crianças. Esse é o mundo que elas têm. Um mundo de migalhas de pão, de resto de comida. A mim parece que os adultos têm mais jeito de defesa. Mas as crianças não. Essas crianças não têm futuro nenhum. E todos os dias eu ouço os discursos oficiais mentirosos. A passeata segue e pára na Praça do Marco Zero,frente a Igreja da Conceição...sim...a santa! O grito dos excluídos,Começa...começa o coro: “A vida em primeiro lugar, a vida em primeiro lugar ”. Grito, grito, grito muitas vezes. Depois a passeata segue e entra na Avenida Rio Branco. Sigo junto, o peito me dói, a vida me dói, os olhos me doem, dói meu coração. Doem minhas mãos. Começa outro coro: “O povo na rua, a luta continua! O povo na rua, a luta continua!” Grito. Grito. Grito. É uma passeata de gente esquecida por tudo e por quase todos. Crianças tristes, de olhos grandes, até indiferentes. Uma passeata da qual até participam alguns cães. Quase todos os mendigos têm um cão que segue junto até o fim da vida. Participo. Sete de Setembro. Domingo de manhã. Um grito no centro velho da cidade, também destruído. Uma das lideranças dos moradores de rua me diz que só no centro existem dezenas de famílias.Olho bem para as crianças, essas crianças que, amanhã, terão uma arma na mão. Essas crianças abandonadas por tudo. 



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